O termo tromboembolismo venoso (TEV) engloba duas condições frequentes, que são a trombose venosa profunda (TVP) e o tromboembolismo pulmonar (TEP), sendo ambos os eventos de causas evitáveis comuns no paciente cirúrgico. A indicação de profilaxia se baseia na alta frequência dessas complicações e no fato de que maioria dos pacientes pode ser assintomática ou cursar com sintomas inespecíficos.
Como o TEP fatal pode ser a primeira manifestação clínica, é inapropriado aguardar o surgimento de sintomas para diagnosticar e tratar um episódio de TEV. Além disso, a detecção da TVP não é um diagnóstico fácil, sendo a prevenção a melhor estratégia. Embora pareça evidente a necessidade de se prevenir estes eventos em todo e qualquer paciente hospitalizado, alguns fatos importantes devem ser considerados:
• O correto planejamento estratégico da profilaxia visa a redução (e não a eliminação) da ocorrência de TVP e suas consequências.
• É necessário levar-se em conta que a indicação da profilaxia considera também os possíveis riscos implicados no uso dos métodos profiláticos, em especial o risco de sangramento associado aos anticoagulantes. Em vários casos, a necessidade de profilaxia prolongada pode trazer inconvenientes, como o aumento no risco de sangramento, a possibilidade de plaquetopenia induzida por heparina, ou mesmo a dificuldade de arcar com os custos dos medicamentos.
Na análise do protocolo de TEV, há necessidade de individualizar o cuidado, considerando-se o paciente de maneira holística, e não somente seguindo um fluxo protocolar, uma vez que as recomendações podem não se aplicar a um paciente específico. As recomendações do protocolo baseiam-se na redução de risco para um grupo de pacientes, necessitando sempre da avaliação da equipe assistencial para a decisão final. Desta forma, os fluxos de classificação e seguimento não são estáticos e necessitam de uma correlação clínica individualizada para que o risco de TEV seja reduzido.
Podemos citar como exemplo um paciente de 30 anos de idade a ser submetido a apendicectomia laparoscópica, sem antecedentes pessoais. Por se tratar de uma cirurgia rápida, que dura em torno de 20 minutos, esse paciente seria classificado como baixo risco e não precisaria de profilaxia para TEV, considerando-se a deambulação e alta precoce. Contudo, uma cirurgia de apendicectomia laparoscópica em um paciente de 30 anos com choque séptico e necessidade de UTI no pós-operatório apresentará uma condição completamente diferente em relação à evolução da doença de base que ocasionou a cirurgia. Logo, fatores de risco para imobilismo e condições clínicas adversas precisam ser consideradas para adequação de classificação, conduta e desfecho. Cada vez mais há a necessidade de irmos além do protocolo.
A equipe multidisciplinar tem um papel fundamental para garantir o sucesso assistencial, que envolve toda a linha do cuidado do paciente cirúrgico e interface com diferentes profissionais. O enfermeiro e o farmacêutico são os grandes propulsores do sucesso da prevenção de TEV, considerando-se que participam de todas as etapas, desde classificação, seguimento da conduta preventiva adotada até a orientação de alta em relação aos medicamentos utilizados após o período hospitalar. O médico define a conduta, e a equipe multidisciplinar consegue acompanhar toda a prescrição medicamentosa, métodos de compressão de membros inferiores, tratamentos fisioterápicos e estímulos à deambulação precoce e segura.
A CMA e seus anestesiologistas vêm desenvolvendo estratégias de melhoria e consolidação dos protocolos de prevenção de TEV, considerando-se que o momento da cirurgia é fundamental para início das medidas de prevenção, bem como interação do anestesiologista, enfermeiro e cirurgião para discussão de condutas adequadas para cada caso. Tais estratégias envolvem também workshops e discussão de casos com o time de médicos, enfermeiros e farmacêuticos, tornando o cuidado cada vez mais multidisciplinar, onde todos estão comprometidos com a segurança do paciente e com a transformação das boas práticas em algo cultural e sólido, integrado ao DNA da equipe.
Por Leopoldo Muniz | CMA – Clínica Médica Anestesiológica